sábado, 18 de janeiro de 2020

Cidade Visível


Sou abordada na rua por alguém que me pergunta como chegar a X:

- Sabe dizer-me como chegar a X?

Responder parece-me impossível. Nunca parti do ponto onde me encontro para chegar até X. Já estive em X, sei onde fica. E já parti daqui para muitos outros lugares. Mas não, a resposta parece-me impossível. 

-O melhor será dirigir-se até Y, é ali já à frente, e perguntar a alguém como chegar até X a partir daí.

Assim o faz. Agora em Y, o nosso sujeito perdido perguntará novamente como chegar a X:

- Sabe dizer-me como chegar a X?

E alguém responderá em titubeante instrução:

- O melhor será dirigir-se até Z, é já ali à frente, e perguntar a alguém como chegar até X a partir daí.

E agora em Z, abordará novo transeunte (tão perdido quanto ele) que lhe indicará um novo meio caminho. Assim vagueará o nosso Aquiles, cada vez mais perto, mas sem nunca alcançar o seu destino. Nesta sua jornada, percorrerá toda a cidade, medida pelas verdades de cada um. Não há unidade de medida universal: cada um dos seus habitantes tem seu próprio passo e a sua própria história. Nenhum deles conhece os nomes das ruelas ou os números das portas. Os percursos X-Y, Y-Z e assim por diante são ditados pelos signos que cada um deles reconhece: varanda tropical, mercearia cidreira, raíz choruda, saco esquecido, cão maldisposto.
Assim vagueará o nosso Aquiles, olhando em frente e esquecendo-se dos seus meios percursos por falta de girassóis vigilantes ou nuvens com forma de tartaruga.






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